Sabe todo
aquele papo de Santo? De pendurar santo de cabeça para baixa para poder
casar-se ou casar a filha, em tese, encalhada? Deve ser uma coisa cultural, só
do Brasil. Afinal, aqui fazem publicidade até com os pobres dos santos! E
quando chega Maio é que se dana tudo. Santo Antônio em tudo que é comercial de
loja de vestido de noiva! Mas o propósito desde dois pra cá, dois pra lá não é
falar de santo, é outro...
Em meus
muitos momentos de devaneios e divagações, imagino sempre Santo Antonio feito
galã da Globo, cheio de cartas, pedidos, promessas e propostas absurdas. Sim, e
careca. Até porque né, vamos combinar, aturar brasileiro reclamando porque
querem se casar e ainda por cima mulheres, não é coisa de Deus! Mas ali
coladinho, na mesa ao lado. O colega de repartição. Com óculos de armação preta
e um ar de quem é feliz, encontra-se o Sr. Amor. E se vocês acham que Santo
Antônio tem trabalho, é porque não pararam pra pensar, se Seu Antônio cumpre
expediente só no Brasil, o Amor é universal!
Sempre o imagino
além dos óculos de armação preta, o cabelo confuso, desgrenhado. Camisa formal
branca, gravata com nó mal feito, preta, minúscula, e all star cinza. Não
lembro se o imagino novo ou velho, porque o Amor sempre se renova. Ele não
envelhece, amadurece. Ele não é novo demais, é precoce ou inesperado. Na mesa
dele, pilhas e pilhas de e-mails impressos, até porque o Amor é moderno, apesar
de preferir carta por achar mais pessoal, ele usa e-mail para não ser chamado
de antiquado.
O Amor é
rotulado por toda a repartição como o "funcionário dedicado", mas
ultimamente ele anda um pouco rebelde. Desde que nasceu o Amor tinha
consciência de que era único, seus pais inventaram esse nome. E ele alega estar
desistindo da profissão, uma vez perguntado o motivo respondera: "Vou me
aposentar, assim não dá, qualquer ser menor é chamado de Amor, Amorzinho, Mô.
Qualquer paixão desemboca em um "Eu te amo" em menos de um mês de
relacionamento, e o pior, ainda completam dizendo que é o "Amor da vida",
vou pedir as contas, Amor que é Amor só um!", indagou ele, exaltadíssimo.
O Amor é
magro, de um olfato apuradíssimo. Alimenta-se de carinho, afeto e todo e
qualquer sentimento de caráter benevolente. Mas ele anda emagrecendo ainda
mais, faz algum tempo que estes sentimentos bons andam em falta no mercado, e
quando se acha o preço está nas alturas! O Sr. Amor tem um trabalho simples,
desde que despediu o cupido ele acumulou tarefas. Não, ele não sai por ai
atirando flechas, ele deu esta função para os nossos olhos. A função do Amor é
apresentar as pessoas que estão dispostas a amar uma as outras em algum momento
da vida. É fazer com que elas digam um "eu te amo" no auge da sua
amadurecência e não um "eu também" insincero. Sim, o Amor faz muito
bem o seu trabalho, ao contrário do que se diz, ele não escolhe quem não
merece, ele se encanta por quem o aceita sem questionamentos, por quem o recebe
de sorriso, abraços e sensações abertas.
O Sr.
Amor é bem humorado, não, as dores não é ele quem as provoca, são pequenos
testes rotulados pelos seres menores de "Dores de amor". Isso faz
parte do seu trabalho, o Amor recompensa todas as dores no final, abraçando-as
e carinhosamente as transforma em boas risadas. O Amor chora, esperneia, faz
bico, mas apenas quando não é reconhecido. O Amor mima, jamais é mimado. O Amor
acolhe os seres mais mal acostumados. O Amor não dorme, ele te observa dormir
para depois dizer que dormes engraçado. O Sr. Amor distribui convites e
poucos leem as letras miúdas, os pequenos detalhes, os gestos minúsculos
e o rasga ou faz aviãozinho.
O Amor tem
residência fixa, uma bicicleta azul e férias uma vez por ano. Não recebe 13º e
ainda aguenta falácias de seus amigos por se contentar com pouco, por ser
autossuficiente, porque para ele o Amor próprio é a base para o próprio Amor.