sábado, 23 de novembro de 2013

Sinestésica

Como ela era?
- Era toda cor e gosto de água de coco,
Cheiro de sol e constelações no rosto.

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Amor que é amor só tem cura com música ruim

- Não, amor que é amor só tem cura depois de cachaça, banho frio e música ruim. Música boa também, mas sobretudo a ruim. Ninguém cura fossa tomando todynho e música clássica, senhor. Engano seu. Um pé na bunda só configura pé na bunda a partir do momento em que um brega se apossa da sua vida e vice versa. Tu lembra da outra vez que tu veio aqui? Então, é de "cena de sangue no bar, na avenida São João" a "então me ajude a segurar essa barra que é gostar de você", essa é clássica. Claro, mas é claro que acentua. mas o brega estanca as piores hemorragias pós pé na bunda, tu vai do choro ao riso já na introdução. Fossa sem música não é fossa. 
Amor mal curado sem música fossa causaria o maior índice de desemprego na música brasileira. O que seriam das fossas sem as músicas que tocam de repente e a gente não tem coragem de mudar? Música assim tem vontade própria seu moço. É ouvir "Olhos nos olhos" nove vezes e descobrir que tu tem nove versões da mesma música, cada versão dando um apunhalada no teu coração amante, de luto, brega...
- É essa a receita, doutor?
- Sim, meu filho, capriche no raça negra e muito banho de mar. Porque a gente sofre, mas a gente não conserva o luto não, viu! Até o drama que vem.

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Nicolah e a árvore


Passou por três árvores, na sua visita a feira literária na qual sua mãe o levou, todas iguais. Luz verde, livros e corações pendurados, pessoas sentadas embaixo. Não entendeu o propósito, já era noite. Pensou "deve ser o costume de procurar sombra.". Na quarta árvore, Nicolah, percebeu um padrão.
 - Mã, por que todo mundo boli nos livros e ninguém mexe no coração? Perguntou o menino, puxando a blusa da mãe.
- Não sei, meu bem, deve ser medo de deixar cair, não sei... Disse a mãe, já rindo e prevendo as perguntas que estaria por vir.
- Mmmm, engraçado... Comentou Nicolah.

- O que, filhote? Perguntou a mãe, abaixando-se para ficar na mesma altura que ele.
- ... nem quando é de graça e dá em árvore as pessoas pegam os corações, gente é um bicho esquisito, mas a senhora tem razão, deve ser medo, vai que alguém colhe, não cuida direito e deixa o coração do outro cair? Já viu a confusão! Ai, essas pessoas sem coração... A gente pode comprar pipoca doce agora?

sábado, 16 de novembro de 2013

Nicolah e a energia

Domingo, dia oficial de tomar sorvete de flocos na casa de Nicolah. Exceto sua mãe, só tomava de coco. Nesse dia tomou sozinho, animado, não tinha dever de casa, dormira até tarde e era dia de sorvete. A única coisa que o irritou nesse dia foi a tentativa de ver desenho que falhou. Uma. Duas, três vezes e a energia caindo.

- Mã, a tv tá desligando sozinha. Três vezes já... Disse Nicolah
- TIRA DA TOMADA QUE VAI QUEIMAR! Gritou a mãe, em tom de mãe.
- Mas...
- Já tirou? E saiu tirando tudo que era eletrônico da tomada.
- Eita, o sorvete vai derreter... Saltou Nicolah do sofá.
- Deixa derreter, tá tudo dando errado mesmo, vai brincar com o cachorro. Resmungou a mãe.

Nicolah, ainda pensando no sorvete, foi brincar com o cachorro no quintal e confessou:
- Chico, quem é que fica calmo com o sorvete derretendo no dia do sorvete? Gente também deve ter queda de energia! Isso que dá não gostar de sorvete de flocos.

Aforismo 11

Sardas:
 resquícios de constelações cadentes na epiderme feminina.

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Carta ao vermelho

Eu sei, é um movimento unilateral esse amor que eu te tenho. Mas é tão estranho, não o amor, mas esse sentimento unilateral, que eu tive que vir aqui te dizer. Eu o aceitei de bom grado, não ando cuidando, nem alimentando, ela tá aqui, sabe, e eu precisava te dizer. Eu poderia esperar passar todas as tuas fases, se é que são fases, dar teu tempo. Eu amo te ver livre, dá a impressão de que te dizer que te amo te prende um pouco, e eu sou louca pela tua leveza, do cachinho da cabeça ao dedo do pé. O problema foi que eu te dei tanta liberdade, desculpa, não fui eu quem deu nada a ti, mas eu me mantive tão espectadora, como no início, ao te conhecer, que alguém te elegeu para o amor. E eu vi vocês, aliás, eu te vi, só a ti e a mais ninguém. Eu sei, eu poderia esperar, esperar que tu me dissesse que pode me amar, que já pode me amar, ou dos males o menor, apaixonar-se por mim, como mulher, que pode me ter amor e tesão ao mesmo tempo, que vai me odiar numa briga idiota, e depois a gente vai fazer as pazes fazendo amor e tomando três cervejas, sempre as três cervejas do primeiro encontro, número exato para não embriagar. Mas eu não consigo, aliás, eu não posso esperar, esperei três meses, viu, o três, cabalístico nessa unilateralidade amorosa. Eu preciso da tua vida na minha. Preciso que nossos sentimentos conversem agora, mas sei que em ti não tem nada além de carinho. Eu não posso esperar, nem vou, não pelo que tu diz e o que dizem do meu signo, mas pelo meu amor, meu amor discorda do Coríntios, ele não é paciente, ele tem necessidade de amar, de te amar! Um dia desses estava pensando como seria acordar ao teu lado, te ver dormir eu já vi, destrambelhada, sem charme algum, mas ainda assim teu rosto conservava uma calma que acordada tu esconde. Eu preciso da tua mão esquentando a minha quando eu for ao cinema e tiver vontade de dormir no meio do filme. Eu tenho distonia, mas também faço por manha, pelo quentinho. Sabe, eu só consegui tocar outras pessoas depois que eu coloquei na cabeça que não te queria mais, não dei certo, claro, eu as beijava e os defeitos, meus e delas afloravam, elas não eram você e aquela não era eu. Eu queria te mostrar meu lugar favorito de comer, o da surpresa de uva que tu tanto gostou, acho que me apaixonei quando tu disse que amava surpresa de uva, chamando-a de uvinha, tanto faz. Apostar corrida na praia, no fim da tarde, detesto sol, nisso discordamos... E te ouvir xingar meu signo, sei que tu acha um inferno e foi uma das coisas que me fez afastar um pouco. Sei que sou ar de mais, como diz uma música que baixei há pouco tempo “eu sou vendaval”, desde pequena, mas o que fazer, tu é mais livre que esse vendaval que te fala besteiras, que te manda beijo sabendo que tu só vai responder um dia depois. Meus amigos dizem que eu ando deixando pelas esquinas e bares meu amor próprio, mas eu discordo, sabe, o problema é que tem amor demais, já não sei de é próprio, alugado, só sei que eu preciso te dar, conversar. Meu amor é ansioso, sente teu cheiro por onde anda, corre e lava as mãos. Teu amor eu acho difícil de ter, é, meu amor é pessimista, mas te juro que ele é a parte mais sã e sincera que a vida escolheu pra carregar em mim. Mas eu não quero carregar sozinha, queria misturar com o teu, até a vida reconhecer ele como um só. Sonhei que a gente cozinhava juntas, eu adoraria te ver cozinhar, adoraria cozinhar, o pouco que sei, pra ti. Cê, viu? Quando menos espero já to fazendo planos, eu evito, mas meu amor não deixa. Eu te evitei, mas meu amor não deixa. Eu preciso que ele sossegue pr’eu poder sossegar de amor.



                                                                                                                                                  Centopeia.