quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Sim, somos gavetas!



Acredito eu, na minha humilde mania de comparar pessoas a objetos, no melhor do sentido, claro, que nesse, ou até nas nossas próximas vidas, somos nada mais que depósitos de coisas boas e más. Sendo mais direta, na vida nada mais somos que gavetas subestimadas, ou melhor, superestimadas! Depende da situação, depende do que ou quem nós guardamos. Acho que ainda nos elevei a um nível além do merecido, porque no final das contas somos um porta treco, mas vamos ficar com gavetas que é uma palavra só, e é isso que somos, só um, só.

Acho que cada um de nós é uma gaveta específica. Eu, particularmente, sou aquela gaveta que se joga um monte de coisa e vai juntando, juntando e não se joga nada fora por falta de coragem, ou medo de perder algo desnecessariamente importante. Mas há quem seja aquela gaveta arrumadinha, aquela que separam cueca ou calcinha por cor, sabe? Aquela que tem etiqueta, lugar para tudo, nada fora do lugar, uma gaveta extremamente organizada para um coração altamente porra louca. Também há uma variação da minha espécie de gaveta, tem lá seu amontoado de coisas, mas de vez em vez é feita uma faxina, são jogados papéis, entradas de cinema, coisas mofadas, mas não consegue jogar as lembranças. Existe aquela que sempre trava no meio do caminho, aquela gaveta/pessoa que deixa tudo pela metade, que se não consegue fechar deixa como está e diz: não vai fechar mesmo, para que insistir! Que está com um problema, mas ignora, falta parafusos, faltam sentimentos.

Pegando o gancho da “falta”, existe também gavetas vazias, sem nada, nem um pedaço de papel sequer, nem uma embalagem de bombom, nem uma caneta, nem uma dessas inutilidades que guardamos mesmo sabendo que não iremos mais usar, são vazias e só.
Também tem aquela que é trancada a uma única chave, que às vezes em ela sabe onde colocou a chave, engoliu, jogou no mar, mandou o cachorro falecido do vizinho engolir, não adianta, a gaveta é um pseudo cofre! Há quem seja uma gaveta seletiva, só guarda o que de fato é para ser guardado, nem a mais, nem a menos, guarda o que faz bem, o que fez e faz rir, tem uma caixinha para guardar as alegrias vividas e abre seus segredos a quem for merecedor. Existe a que só aprende a fechar com porrada, é a de praxe, não aprende com carinho ou gestos de bondade, só aprende com muita pesada no seu puxador! Também tem aquela que vive 24h aberta, parece banco, sabe? É a gaveta solícita, hoje em dia é móvel raro, quase não se tem por aí, mas apesar de ser aberta para os outros é fechada pra si própria, não guarda nada ali, tem seu anexo secreto feito Anne Frank, e morre de medo que alguém chegue perto.

São muitas, inúmeras, mas todas elas têm coisas em comum, elas guardam, cuidam das lembranças, às vezes tem um cheirinho especial, não tem a gaveta ideal, tem a gaveta que escolhemos ser, que passamos a ser, e que cuidemos uns dos outros independente do tipo de gaveta que somos. Coloridas, tom pastel, de solteiro, que trava, que vive uma bagunça, sem puxador. Temos a mesma função, guardar.

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Drummond tinha razão!


E o que os ares me trazem?
Me trazem o pólen, o óleo, o filtro, os cheiros
E me roubam as palavras!
Elas já não vêm aos montes, felizes crianças após o sinal tocar...
Não!
Estão entaladas, moídas, cheias de dor e prazer noturno.
Umas vêm pela metade, mordidas, cuspidas, bebidas, às vezes nem vêm!
As poucas que chegam me fazem desistir delas, desnecessárias, demasiadamente pessoais,
Mas se elas não vêm, nem sem forma, disformes, entro em estado de fome literária,
Não consigo mais fazer florir em mim as palavras, elas murcham, elas entram em overdose de pólen e secam!
Sim, Sr. Dummond de Andrade, lutar com as palavras é sim uma luta vã!
Já não consigo mais semeá-las, emudeceram todas!
Nenhuma vem me acordar de madrugada sussurrando em meus ouvidos para serem escritas,
Pelo contrário! Elas me fazem cafuné, alisam meu pescoço, me deixam dormir à vontade
Com esse silêncio insuportável que elas me fazem ficar!
Acho que elas querem que eu volte a desenhar...
Não posso mais, entreguei a alma as palavras!
Os traços não saem mais, a mão dói, o sentimento de traição pesa
Meu santo bateu na prosa, na poesia, na lira, no verso do poeta gauche, no zumbido do poeta marginal.
As palavras a mim andam teimosas, as palavras em mim nem andam mais, perderam as pernas e a vontade de serem parte de mim.
Elas se negam a esconder alguém por debaixo dos lençóis que cobrem o verso,
Preciso chorar para que elas saiam, preciso plantar em pleno verão!
Preciso manter os olhos limpos e os cabelos encaracolados cheios de nós, de nó, de anedotas.
Preciso-as.
Elas não precisam de mim, nem de você que lê...
Elas precisam do menino fazendo pergunta, da menina sujando o vestido,
Elas só precisam delas próprias, do encantamento diário,
Das flores do verão, do cobertor de orelhas no inverno,
Elas transitam...
Tomaram o lugar das minhas veias, beijaram meus cílios....
Embaçaram minha vista... Ai, palavras... Acho que somos um só...
Inconstantes nessa vida que não será minha primeira, nem suas últimas,
Sejam sempre bem vindas e jamais findas...

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Última carta


A carta veio sem assinatura, e por conseguinte, sem remetente. Se não me falhe a memória, nela tinha escrito:


Minha querida,


Onde foste parar? Cadê tua alegria? Cadê teus metros de sorriso?Não te reconheço mais! Já não me escreves mais, já não escreves mais! Todo dia olho para ver se escreveste algo novo, e nada. Não te vejo mais falando de vinho, cigarro, amores mal dormidos, minha querida, já nem te vejo. Será que foste parar na terra dos balões? Em um lugar tão distante que já não avisto tua essência. Cadê tuas bobagens ditas que nos faziam chorar de rir? Já não és a inconstância linda que eu conheci. Estancaste em teu sofrimento. Já não danças, não gargalhas, não levantas a cabeça pra se despedir. O que houve, minha querida? Conta para mim, por favor. Te dou meu colo, meus ombros e meus ouvidos só para te trazeres de volta. De volta aos teus amigos, aos teus verdadeiros amigos. Não quero que te percas mais de ti, muito menos que amadureças da forma que esses tais amadurecem. Cultiva essa tua essência, que mesmo estando distante sei que é só tua, minha querida.

Com saudade.

Duas horas depois percebi que minha alma que estava a gritar essas palavras, que cansada de tanto se esconder sussurrou Quintana em meu ouvido: "Ai que saudade de mim.".

domingo, 4 de dezembro de 2011

Poe(a)ma(r)


Pomar
Vem uma criança brincar
Vem a chuva molhar
E de todas essas coisas que terminam com - ar
Ficou apenas um poema de uma criança na flor da inocência
Dizendo que muito se tem de amar
!